quinta-feira, 5 de abril de 2012

Entrevista


Recebi este questionário da Rebeckah, ex-aluna do CIE, que está cursando Licenciatura em Educação Artística, para um trabalho dela na faculdade. Gostei tanto de responder, que resolvi postar aqui no blog para ficar o registro.

Professor
1 – Qual o seu nome completo: Rafael Fernandes de Souza
2 – Quantos anos tem? 34 anos. Onde nasceu? Brasília - DF
3 – Que curso fez? Bacharelado e Licenciatura em História
4 – Quantos anos dura o curso? Quatro anos.

5 – Há quantos anos é professor (a)?
Desde 2001. São onze anos de profissão

6 – Há quanto anos é professor (a) na escola?
No CIE, desde que comecei a dar aula, até o ano passado. Trabalhei lá por dez anos e meio. Em 2012 fui lecionar em São Sebastião, mas fiquei apenas o mês de fevereiro. Hoje estou cedido a outro órgão. Sou Gerente de Cultura da Administração Regional do Cruzeiro.

7 – Trabalha em outras escolas? Quais?
Sempre dei aula em duas escolas por ano, pois minha carga horária é de 20h (diurno) + 20h (noturno). Além do CIE onde sempre trabalhei, também fiquei 3 anos e meio no CEF 02 do Cruzeiro, 3 anos no CEduc 01 do Cruzeiro, 1 ano e meio no Polivalente, 1 ano na EC da 204 Sul e um ano em São Sebastião, onde retornei por um mês este ano.

8 – Em quantas turmas e séries leciona?
Nos dois últimos anos no CIE lecionei para as turmas de 3ºano regular, sendo 5 turmas em 2010 e 4 turmas em 2011, além de três turmas de Aceleração que têm uma carga horária maior. Este ano lecionei por um mês em São Sebastião, com 6 turmas de 1º ano pela manhã e outras 6 a noite.

9 – Gosta de ser professor? Por quê?
Gosto sim. Além do ambiente escolar que acho muito bom, a prática de pesquisar sobre um assunto e compartilhar com os alunos é muito prazeroso. Quem não gostaria de ler e falar sobre o que gosta?

10 – Quais as coisas boas e ruins da profissão? Por quê?
O lado positivo é fazer um trabalho importante para a sociedade, que não traz benefícios para apenas um indivíduo, mas a coletividade. A oportunidade de trazer questionamentos que muitas vezes passam despercebidos no dia a dia, e que na escola são abordados. É uma profissão que gratifica não por ganhos materiais, mas pelo aspecto humano que proporciona.
O lado negativo é quando não há ressonância. Quando o professor briga, chama a atenção porque o aluno não está nem aí. Muitos professores ficam desestimulados, pois seu trabalho é ignorado justamente por parte das pessoas pelas quais ele mais se esforça. Com o passar dos anos fica cada vez mais desgastante trabalhar com alunos desinteressados, que correspondem a mais da metade de uma turma.

11 – Quais os problemas mais sérios da escola? O que pode ser feito para resolvê-los?
Enquanto educação for prioridade só no discurso, nada será resolvido. Estamos no meio de uma greve e a desvalorização não é só por parte do governo em função dos salários. A própria sociedade não trata a educação como prioridade. A maior queixa que vejo com relação à greve, é que os pais não têm onde deixar os filhos porque as escolas estão fechadas. A sociedade de hoje, onde pai e mãe geralmente trabalham, transferiu para os professores o papel de criar seus filhos, quando na verdade o professor está ali para passar informação, conhecimento, a formação como cidadão. A educação elementar, a formação como ser humano é papel dos pais; e vejo que muitos não fazem isso, pelo menos de maneira adequada. Enquanto toda a sociedade não compreender qual é a função do professor, todos os outros problemas, como violência, estrutura precária, falta de motivação (de professores e alunos) vai continuar. Falta um verdadeiro pacto entre sociedade, Estado e profissionais da educação. Enquanto isso não ocorre, convivemos com greves, brigas nas escolas, professores doentes física e psicologicamente, alunos sendo aprovados sem um conhecimento mínimo para sua vida pós-escolar.

12 – Você acha importante ensinar Educação Patrimonial aos alunos? Por quê?
Esta é uma das minhas áreas favoritas. Gosto muito de viver em Brasília, e como Patrimônio Cultural da Humanidade, ela proporciona um debate muito rico sobre esta questão. A cidade foi criada com uma proposta única de convivência que não foi compreendida por quem é de fora, e mesmo por quem é daqui, e em função disto suas características mais importantes vão se perdendo. A Educação Patrimonial é um meio para se compreender não só porque a cidade ganhou um título da UNESCO, mas porque temos de cuidar do que é público. A sociedade capitalista é muito individualista, as pessoas só querem cuidar do que é “meu”, e acham que o público não tem dono, quando na verdade é “nosso”. Viver em sociedade não é cada um no seu cantinho. É compartilhar o que a cidade oferece, e fazer o que estiver ao alcance para preservar.

13 – Como é a metodologia usada para ensinar Educação Patrimonial aos alunos? São feitos exercícios manuais (desenhos, esculturas, maquetes, etc), questionários, descrições verbais, escritas, vídeos, peças teatrais, visitas a museus, etc?
Em 2010 lecionei Parte Diversificada (PD) para turmas de 5ª e 6ª série no CEF 02. Foi ótimo, pois era o cinquentenário de Brasília, havia muito material e não estava preso ao conteúdo de História. Trabalhei metade do ano com toda sorte de atividades, desde textos e vídeos até a produção de maquetes e pesquisas sobre as cidades do DF. Os alunos produziram bastante. Fiquei devendo uma visita à Esplanada, que estava planejada, mas o receio com o mau-comportamento de alguns acabou sendo um empecilho. Mas ver “in loco” é parte fundamental deste tipo de trabalho.

14 – De que forma a escola apoia este processo de aprendizagem de Educação Patrimonial?
Tive outras oportunidades de trabalhar este tema, onde a escola deu apoio material dentro das condições possíveis. A própria escola pode ser muito favorecida com este processo, pois cuidar do ambiente mais próximo é parte da Educação Patrimonial. Um maior envolvimento com outros professores seria importante, mas nem sempre ocorreu.

15 – Você acha importante a abordagem deste tema no projeto pedagógico?
Sim, porque daria condições para continuidade do projeto. Há uma rotatividade muito grande entre professores nas escolas. Às vezes um projeto é interrompido porque o professor fica excedente para o ano seguinte e vai para outra escola. Se o projeto era dele, a escola perde. Se fizer parte do Projeto Pedagógico, a escola toda vai assumir a tarefa e prosseguir com o trabalho.

16 – Os alunos demonstram interesse e os objetivos de aprendizagem são cumpridos como o esperado?
Esta tem sido a parte mais triste a meu ver. Ano passado eu fiquei seis meses no cargo que ocupo agora novamente. Saí da Administração Regional por divergências políticas e retornei ao CIE para as mesmas séries com as quais havia trabalhado no ano anterior. Após dez anos na mesma escola, onde dei aula nos três turnos, constatei que o interesse, a relação dos alunos com a escola vem piorando a cada ano. É uma luta ter uma parcela cada vez maior de alunos que não ligam a mínima para o que significa estar ali. Alunos que estão concluindo o Ensino Médio. Eu sempre tive um orgulho muito grande em dar aula por dez anos seguidos no CIE, escola onde estudei, me formei e voltei logo após concluir a faculdade. A cada ano eu fazia de tudo para permanecer na escola, mas em 2012 vi que não dava mais e saí naturalmente. Fui dar aula na primeira escola onde trabalhei, em São Sebastião, um lugar longe de casa. Foi uma experiência revigorante. Peguei turmas de 1º ano em uma cidade carente, mas com uma vontade muito grande. Após vários anos, eu me sentia bem dando aula. Havia uma parceria com as turmas. Mais do que salário alto e boa estrutura, o que eu mais sentia falta era de ter turmas onde o trabalho fluía. Por ironia do destino, a distância e o horário atrapalhavam bastante, pois ia de manhã e a noite. Com a mudança de Administrador Regional no Cruzeiro, fui convidado a voltar para a Gerência de Cultura. A paixão pela cidade falou mais alto e reassumi o cargo. Mas quando tiver de voltar para sala de aula, sei que vou querer voltar para São Sebastião. Devo isso àquela escola. Tinha a certeza de que cumpriria os objetivos ali. Por um mês senti o gostinho bom de dar aula com motivação para turmas interessadas.

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